“Não deixo minha chapada nem no último pau de arara”

A programação do IV ENA seguiu no segundo dia de evento (01/06), com 16 instalações artístico-pedagógicas dos diversos biomas brasileiros, lutas e resistências dos territórios. A tenda da Caatinga II apresentou as trajetórias da Chapada do Apodi, no Rio Grande do Norte, e Chapada do Araripe, em Pernambuco, com seus enfrentamentos ao agronegócio e grandes projetos e as alternativas construídas coletivamente com agricultoras, agricultores, movimentos e organizações para que o povo possa permanecer com qualidade de vida em seus territórios.

Dentre os conflitos no Araripe, Geovane Xenofonte, da organização social Caatinga, explica que a exploração da gipsita para a produção gesseira e a previsão de um canal de transposição do Rio São Francisco para o monocultivo da cana de açúcar e eucalipto vem ameaçando a vida no campo e na cidade. “A vida no território pode ser melhor através da agroecologia e da convivência com o semiárido, com cada um que está aqui, a partir da Rede do Araripe, fórum de mulheres e de juventude, das feiras agroecológicas”. Samara Santana, do Fórum de juventude do Araripe, completa o relato apontando a preocupação com a sucessão rural na região. “Os jovens não vêem seu lugar como futuro e o êxodo rural é nosso principal problema. Em rede, estamos trabalhando para mostrar que a agroecologia é para nos mostrar que viver do campo é possível”, alerta.

Após a apresentação do Araripe, Camila Paula, do Centro Feminista e da Marcha Mundial das Mulheres, e Adriano Vieira, da Rede Xique Xique, contam a história da Chapada do Apodi através de um cordel que resgata 30 anos de luta na região. O cordel feito por Dona Francina, agricultora do Apodi, enfatiza o fazer agroecológico e resistência aos projetos de perímetro irrigado e exploração do aquífero Jandaíra, além de destacar a organização popular e a resistência das mulheres.  Desde 2012, o povo da Chapada do Apodi vem lutando contra o projeto de perímetro irrigado da barragem de Santa Cruz, que expulsaria o povo de suas terras e iria redirecionar a água da barragem para as grandes empresas do agronegócio. A partir da resistência das famílias e organizações sociais e sindicais que trabalham com agricultura familiar no território, o projeto não foi implementando como previsto. No entanto, as empresas de monocultivos de frutas para exportação estão explorando as águas subterrâneas fora da área do perímetro, com escavação de poços profundos que monopolizam o uso do aquífero Jandaíra, um dos maiores mananciais de água do Brasil. Além disso, há também um risco alto de contaminação da água pelo uso intensivo de veneno usado nos monocultivos.

As mulheres têm tido um papel fundamental à frente das resistências, seja na produção dos quintais, seja em grandes mobilizações, até em nível internacional, como aconteceu na Campanha 24 horas de Ação Feminista, “Somos todas Apodi”, junto à Marcha Mundial das Mulheres, em 2012. O agricultor Antônio Rodrigues, conhecido como  Golinha, da Chapada do Apodi, opina sobre o conflito na região: “A gente luta pra seguir cultivando sem agrotóxicos e químicos. A nossa Chapada tem o melhor solo e é rico em água. Mas estão perseguindo nossa água, nosso solo, nosso lençol. Perseguindo a vida do agricultor, contaminando nossas terras dizendo que vão trazer riquezas. Mas riquezas pra quem?”. Em meio à problematização da exploração dos territórios e da resistência popular, Golinha mostra estímulo para seguir na luta: “Não saio da minha Chapada nem no último pau de arara!”.

Por Camila Paula

Edição: Luciana Rios