A importância da troca de saberes entre os agricultores na agroecologia

O intercâmbio dos agricultores, técnicos e setores parceiros tem se confirmado como uma das metodologias mais importantes da agroecologia.

Agricultor desde criança, Genildo de Jesus, morador de Manaus (AM), participou ativamente da Caravana Agroecológica e Cultural da Região Sul. Questionador, queria saber tudo sobre o que o bioma oferece. Solos, frutos, manejos, climas, plantas, povos, tudo era alvo de sua curiosidade. Nessa entrevista ele fala sobre a importância da troca de experiência entre os agricultores, relatando como isso se traduz na prática em seu território. A diversidade, segundo ele, é fundamental para a promoção da agroecologia.

Como é seu trabalho na sua região?

Sou produtor, trabalho em Manaus, vendo todos os sábados produtos orgânicos numa feira. Só que ainda não temos certificação, só uma declaração do Ministério da Agricultura para vender diretamente ao consumidor. Estamos constituindo agora a Rede Maniva de Agroecologia, e estamos batalhando para certificar os agricultores. No nosso grupo tem trinta produtores, e cerca de cinquenta interessados em participar só que o processo é lento. Tem que ficar monitorando o terreno da pessoa, ver todo o processo, ver se nunca usou produto químico, se não usa queimada, então é assim. Mas o mercado do orgânico em Manaus é realmente muito bom, como em todo o Brasil. Às vezes você tem mais consumidor que a própria produção, porque não é fácil produzir organicamente. Você usa muito a troca de experiências, o que deu certo com um produtor outro procura fazer igual, o que eu sei um pouquinho passo para outro produtor, e assim sucessivamente. É uma troca de saberes da própria experiência dos produtores.

É muito satisfatório trabalhar com a agroecologia, porque a pessoa está fazendo o bem não só a ela, mas também para o consumidor e o meio ambiente. Temos que cuidar do nosso planeta, do nosso solo e da nossa água, porque se não logo logo o nosso planeta vai ficar sem condições. Já está muito destruído, então temos que procurar conservar cada vez mais: modificar e consertar os erros que cometemos no passado para que esse planeta fique para os nossos filhos e netos. As novas gerações têm que encontrar um planeta mais humano, renovado, e plantar madeiras nativas, reflorestar onde foi desmatado. Onde está só degradado você tem que recuperar, nunca ficar derrubando e indo para outras áreas. Aquela mesma área, se for bem manejada, com certeza dará um bom fruto. Fazer sempre compostagem e cobrir o solo, jamais deixá-lo descoberto.

Quais são os produtos que você tem em Manaus e em que quantidade?

Eu trabalho mais com hortaliças, produzo alface, rúcula, salsa, agrião, almeirão, cheiro verde e outras coisas. Mas agora já estou com maxixe, quiabo, um monte de coisa, e fazendo meu sistema agroflorestal com as madeiras do futuro. Tenho castanheira quase dando fruto já, tucumã, etc. Coisas do futuro porque o camarada não pode pensar só em hoje, tem que pensar no amanhã. Imagina o tanto de castanha que eu já comi sem plantar, é muita coisa. Então, também tenho que fazer o mínimo para deixar para alguém. E valorizar nossa floresta e mata, porque além de ser um alimento bom você não pode pensar só em você, tem que pensar nos próximos.

Nossa produção é satisfatória, não posso me queixar. Eu e minha mulher plantamos na minha propriedade, mas vendemos na Associação dos Produtores Orgânicos do Estado do Amazonas (Apoam). Estamos muito satisfeitos, porque a produção está correspondendo muito bem. Fiz diversos cursos, tenho viajado muito, a Rede Maniva tem proporcionado essa força para a gente. A cada dia estou aprendendo mais, vendo na dificuldade de outros estados como o pessoal trabalha, sempre tentando levar para o meu município uma coisa melhor. Trocar experiência é fundamental.

Qualquer produtor para ter sucesso na sua propriedade tem que procurar em primeiro lugar plantar diversas leguminosas, com isso você terá biomassa para o solo e tudo mais. Na minha área tenho a mucuna, feijão guandu, tefrósia, feijão de porco, diversas leguminosas que ajudam no meu solo. Acredito que não existe solo ruim, existe solo mal manejado. O solo é só para sustentar uma planta, se você botar uma pilha de compostagem de até 40cm em cima de uma pedra de cimento você pode plantar a verdura e hortaliça que você quiser. E se colocar um metro pode plantar até fruteiras, isso significa que não existe terra ruim, existe manejo. Esse é o sistema que deixa o solo fértil a todo tempo. Então, é vital conservar o solo na produção.

Você vende pelos programas públicos de compra direta, como Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)?

No momento a Rede Maniva está trabalhando para conseguir a certificação, mas já tem uma articulação para começarmos a vender para a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o PAA e o PNAE, essas coisas todas. Isso facilita muito para a gente, então estamos nos organizando para ter o selo. Porque esses órgãos querem realmente comprar, e para valer nossos direitos com o valor 30% superior ao convencional temos que ter o selo. O governo de um modo geral está ajudando muito o pequeno produtor, mas é evidente que não podemos nunca dizer que é o suficiente. Sempre falta mais, mas pelo menos o governo está olhando para a gente.

Como é essa coisa de você participar de eventos, trocando, experimentando novas espécies e formas de plantio?

É fundamental. Você não pode nunca dizer que o milho só dá em São Paulo ou no Rio Grande do Sul, você só sabe experimentando. Então quando eu viajo por aí pego as sementes de outra área para experimentar na minha terra, por isso já estou produzindo diversas plantas que não são do Amazonas. Tenho jabuticaba, siriguela, diversas variedades, e aconselho também aos produtores que procurem plantar suas plantas nativas para não perdê-las. São muito importantes, porque o tempo está se passando e estamos perdendo nossas raízes, nossas sementes e culturas. Tem tantas coisas nativas na nossa região que muitas pessoas da cidade não conhecem mais, então temos que resgatar esse potencial. Cada estado deve ter no mínimo quarenta frutas, verduras ou folhas, que se comem e o povo está esquecendo e perdendo. Alface não é do Brasil, só querem pensar nela, mas temos a couve e tantas outras folhas regionais que o povo não valoriza. Com o resgate dessa cultural local é certo o bom resultado.

É preciso sempre plantar na policultura. Na natureza você pode observar na mata que tem planta de várias espécies, não é um pé de castanheira, é tudo misturado, então temos que trabalhar dessa mesma forma. Tenho feito isso na minha propriedade e está dando certo, as plantas protegem umas às outras, você tem que plantar tudo junto com inteligência. Enquanto você planta uma muda de coco que vai dar daqui a uns cinco anos, no meio você pode plantar um pé de araçá, quiabo e outras coisas. Até o coqueiro produzir você está ganhando dinheiro em cima disso. O coqueiro vai se dar bem e gostar, e enquanto ele não desenvolve sua idade de produção você está desenvolvendo outras coisas. Temos que procurar trabalhar com inteligência, nunca só com monocultura, e tem que ter paciência. A natureza é assim, pode observar, cada planta tem o seu tempo de florar e produzir. Se você imitar a natureza, meu amigo, terá muito sucesso.

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